RESENHA ACADÊMICA CRITICA: TEXTOS DE GROSSI E KAFKA 3
Ligia de Barros Alves[1]
Escrito por Franz Kafka e publicado no livro O Processo,
“Diante da Lei” é uma fábula-trecho que aborda o acesso da justiça aos cidadãos
de uma forma geral. O livro foi publicado em 1925 e apesar de ser uma história
antiga, se adapta perfeitamente aos dias atuais.
Franz Kafka era formado em Direito pela Escola de Praga. Suas obras são
parábolas baseadas no realismo com uma abordagem irônica. Estas conseguem
abordar os processos judiciais em relação ao homem moderno. Algumas de suas
obras de maior sucesso foram A Metamorfose, O Castelo e A
Sentença.
Seus textos, apesar de fáceis e simples, exigem certo raciocínio
para entender o real significado por trás de suas palavras. São escritos em
formas de parábolas e fábulas, as quais podem trazer uma linguagem figurada com
sentido moral.
No trecho de “Diante da Lei”, um homem do campo tenta passar por um
porteiro que o impede de entrar na lei. Apesar de seus esforços, de seu
pensamento de que a lei deve ser acessível a todos e da porta continuar aberta,
o homem não possui argumentos suficientes que convençam o porteiro de deixá-lo
passar.
Após passar meses e anos sentado esperando sua
oportunidade, o homem envelhece e se vê à beira da morte. Como último
pensamento, ele se questiona sobre o fato de ninguém mais ter tentado passar
por aquela porta por todos aqueles anos. O porteiro argumenta que a passagem
pela porta dependia apenas do homem, de seus conhecimentos em relação aquilo e
que isso era uma coisa que somente ele poderia ter obtido.
A fábula é um trecho do livro O Processo, possui uma
página. Não possui ilustrações nem diagramas. Trata-se de um romance e o autor
utiliza-se de um prévio conhecimento jurídico para transformar o texto em uma
fábula.
O mesmo tema, porém com abordagem diferente, é tratado no livro Primeira
Lição Sobre Direito, que foi escrito pro Paolo Grossi no ano de 2006. Neste
o autor discorre sobre as primeiras lições de Direito para os ingressantes do
curso. Além disso, mostra as várias faces do Direito que não aparecem em um
primeiro momento ao estudante. O livro foi publicado pela Editora Forense, no
Rio de Janeiro. Grossi nasceu em 1933, é professor de
História do Direito Medieval e Moderno na Universidade de Florença. Recebeu o
titulo de doutor honoris causa em Direito em várias
Universidades pelo mundo, incluindo a Universidade Federal do Rio Grande do Sul
e a Universidade Federal do Paraná. É membro da Accademia Nazionale dei Lincei.
Seu texto possui leitura fácil e simples, a
linguagem é acessível e sem muitos termos técnicos que dificultariam a leitura.
Na primeira parte de seu livro, Grossi aborda o Direito como uma coisa
imaterial. Segundo ele, o Direito não faz parte do mundo dos signos sensíveis,
porém, este está presente de várias formas.
Por conta dessa imaterialidade, o Direito acaba tornando-se um desafio ao homem
comum, que apesar de saber da sua existência, não faz a mínima ideia de como
utilizá-lo a seu favor. Para Grossi, a lei passa a ser encarada como uma
sanção, e não como um direito.
Grossi lembra que o direito vem da própria sociedade e que esta deve fazer
parte e se inteirar desta realidade, que apesar de complexa, é articulada e
imóvel.
O trecho é composto por onze páginas, não possui ilustrações ou diagramas. O
autor possui conhecimento prévio do assunto, desenvolveu o texto com
metodologia bibliográfica.
Em ambos os textos, o Direito é abordado como uma matéria de difícil acesso ao
homem comum. Kafka utiliza o método de parábola para descrever uma situação
habitual, em que um homem comum pode se deparar. Devido a essa metodologia de
escrita, seu texto acaba se tornando difícil de compreender em sua essência,
exigindo para um leigo uma busca posterior sobre o assunto.
Já Grossi utiliza um método mais fácil de explicação e que não requer um
conhecimento prévio. Aborda, assim como Kafka, como o homem comum possui
dificuldade, e por muitas vezes medo, perante o acesso à lei. Isto resulta de
uma separação política da sociedade e do direito, quando isto nunca deveria
ocorrer, pois o direito decorre das relações jurídicas sociais. Seu texto ainda
se complementa com um possível resgate do Direito, fazendo este se tornar
acessível e menos complicado a quem não entende.
De certo modo, os textos se complementam, apresentam como tema central a
imateraliedade do direito perante uma pessoa sem conhecimento. O texto de
Grossi facilmente serviria como um apoio didático perante a leitura de Franz
Kafka.
Várias são as razões que fizeram com que o Direito e a sociedade se
distanciassem e se tornassem estranhos um para o outro. Acreditamos que parte
dessas razões se devem à educação precária que é oferecida na rede pública,
onde a maior parte da população vem a estudar. Não é de interesse do governo
fazer com que esta parte tome conhecimento dos seus direitos. Cabe a nova
geração de juristas mudar esta realidade em longo prazo.
Ambos os textos podem ser lidos por qualquer pessoa, porém como já ressaltado,
a leitura de Kafka exige um conhecimento prévio ou uma busca posterior sobre o
assunto, já o texto de Grossi possui fácil entendimento da linguagem e do
assunto.
REFERENCIAS:
KAFKA, Franz. O processo.
Trad. Marcelo Backes. Porto Alegre: L&PM, 2011. p. 246-247
GROSSI, Paolo. Primeira lição
sobre direito. Trad. Ricardo Marcelo Fonseca. Rio de Janeiro: Forense,
2006. p. 1-11
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